quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Num mundo de processados, a criança não aprende o que é processo

Caros leitores,

li este texto incrível e não poderia deixar de compartilhar.

Se trata de uma realidade cada vez mais comum: crianças que não sabem que o leite vem da vaca (e sim da prateleira do Supermercado), que quando os pais dizem que não tem dinheiro para comprar o que querem, os filhos dizem "Se não tem dinheiro, passa o cartão/ dá um cheque" e assim por diante.

Quem nunca ouviu essas pérolas de nossas crianças, não é verdade?!

A noção de que as coisas são produzidas e adquiridas em um longo processo (seja ele o ciclo de vida da vaca para ela poder chegar à fase de amamentação do seu filhote; ou mesmo o ciclo de trabalho, ganho do dinheiro e uso dos mesmo às necessidades mais primordiais da família) hoje em dia está cada vez mais ausente na vida de nossas crianças.

E não, a culpa não é única e exclusivamente da família que dá tudo pronto à criança. A própria sociedade e nossa Era Contemporânea nos oferece muitas facilidades, onde é rápido e prático obter tudo pronto.

No entanto, podemos buscar caminhos para que as crianças entendam que tudo tem o seu ritmo, o seu tempo. O primeiro deles, é trata-las como crianças!!!

Leitura imperdível!
Boa leitura!!!

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Ouvi de uma menina beirando os 8 anos que seu sonho era fazer uma boneca, não  importava como ela fosse. Podia ser de papel, de pano, de milho, como a que fez nas férias com a prima que mora no interior do Ceará (as mesmas que sua mãe fazia na infância). Sua fala me surpreendeu e me encantou. Ela estava na contramão do desejo da maioria das meninas de sua idade por bonecas industrializadas.
Aqui, não vem ao caso o significado deste desejo, mas o episódio me fez pensar no quanto as crianças de hoje estão sendo isentas dos processos de feitura. Tudo vem pronto, processado – pela indústria ou outras pessoas.
Durante um bom tempo os brinquedos foram construídos pelas crianças, com sua participação ou pelo menos com sua presença ao lado de quem o executava. A criança tinha oportunidade de acompanhar, se não todo o processo, uma parte dele. O desejo de ter atravessava o fazer e a espera.
Isto não se limitava à confecção de brinquedos. A criança vivenciava começo, meio e fim, antes e depois, nas pequenas coisas cotidianas. Para chupar laranja era preciso descascá-la. Para comer bolo, fazê-lo. Para ter um cachorro, esperar que alguma cadela desse cria. Para morar na casa própria, era possível vê-la ganhando forma dia após dia.
Hoje, não é surpresa para ninguém uma criança não saber chupar laranja e morar no sudeste brasileiro; não saber que bolo é feito de manteiga,  farinha, ovo ou ingredientes que os substituam; não saber que cachorro mama na cadela e que para construir casa usa tijolo, cimento e outros materiais.
Em um mundo aonde nossas necessidades e desejos vêm prontos (até o cachorro sai de vitrine!) – ou são sempre possíveis de ser realizados – as crianças estão sendo eximidas da participação nos processos das coisas mais banais da vida. O tempo é do instantâneo, do imediato, do sem espera.  Por isto mesmo, o tempo é do desprezível, do descartável, do usa e joga fora – de caixas longa vida às relações afetivas (para não dizer à própria vida).
Sei que existe um passado que não volta mais e que a vida contemporânea está cheia de privilégios que antes não existiam – poder terminar uma relação quando se percebe que não vale à pena levá-la adiante, falar “cara a cara” com quem mora distante, ter uma doença curada, são exemplos de uma infinidade de coisas boas que a contemporaneidade tem nos permitido e que não devem ser esquecidas.
Qualquer época é regada de aspectos positivos e negativos. No entanto, penso que é primordial indagar como nossas crianças enfrentarão os desafios que a vida apresenta, se estamos mergulhados num mundo em que raramente é dado tempo de maturação; ou seja, tempo para que um processo aconteça, com todas as etapas envolvidas, inclusive a resolução de dúvidas, conflitos e o encontro de soluções.
Creio que existe uma correlação entre o tempo do instantâneo e as sensações de esvaziamento e de falta de sentido vivenciadas por muitos, inclusive crianças, que têm se deprimido ou apresentado outros sintomas porque não participam ativamente de suas próprias vidas. Há sempre um gestor externo, do publicitário à família e sociedade. Há sempre um preenchimento do que parece vazio ou faltante.
No meu ver, há dois mecanismos que se somam a este tempo atual, e por isso merecem atenção:
1) A existência de certa equidade entre ser criança e ser adulto. Quando há um desnivelamento hierárquico adulto-criança, fica difícil saber quem é quem e, portanto, quais são os limites, deveres e responsabilidades de cada um.
2) A desobrigação da criança na participação de pequenas coisas do dia a dia. Afinal, como diz a música de Arnaldo Antunes, criança não trabalha, criança dá trabalho (se de um lado a música é uma defesa à infância sem trabalho em seu sensu stricto, de outro, revela um aspecto do contemporâneo de nossas crianças: ter sempre alguém para fazer por ela, criando uma relação de muita dependência e pouca autonomia).
Os processos são constituídos de ciclos, ordem e limites. Quando abolidos da vida das crianças (e adultos), fica muito difícil suportar o que não vem pronto e imediatamente.
Não há como combater o tempo, mas é possível que as crianças sejam ativas nos processos que envolvem sua vida. Para isso, é preciso incentivar sua participação nos processos que a envolve direta e indiretamente. É preciso que criança possa ser criança e que  adulto possa ser adulto. É preciso permitir a criança testar, experimentar e errar. É preciso estar junto, suportando o tempo da espera e do ritmo de cada um.


FONTE: http://ninguemcrescesozinho.com/2013/10/07/num-mundo-de-processados-a-crianca-nao-aprende-o-que-e-processo/#comments

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

O Direito das Crianças - Ruth Rocha

O Direito das Crianças

Ruth Rocha


Toda criança no mundo
Deve ser bem protegida
Contra os rigores do tempo
Contra os rigores da vida.

Criança tem que ter nome...

Criança tem que ter lar
Ter saúde e não ter fome
Ter segurança e estudar.

Não é questão de querer
Nem questão de concordar
Os diretos das crianças
Todos tem de respeitar.

Tem direito à atenção
Direito de não ter medos
Direito a livros e a pão
Direito de ter brinquedos.

Mas criança também tem
O direito de sorrir.
Correr na beira do mar,
Ter lápis de colorir…

Ver uma estrela cadente,
Filme que tenha robô,
Ganhar um lindo presente,
Ouvir histórias do avô.

Descer do escorregador,
Fazer bolha de sabão,
Sorvete, se faz calor,
Brincar de adivinhação.

Morango com chantilly,
Ver mágico de cartola,
O canto do bem-te-vi,
Bola, bola, bola, bola!

Lamber fundo da panela
Ser tratada com afeição
Ser alegre e tagarela
Poder também dizer não!

Carrinho, jogos, bonecas,
Montar um jogo de armar,
Amarelinha, petecas,
E uma corda de pular.

domingo, 21 de setembro de 2014

6 princípios que a escola e os pais devem ensinar

Responsabilidade, autonomia, altruísmo e gratidão são algumas noções fundamentais para garantir que as crianças saibam se colocar no futuro que as espera de maneira a conseguir transformá-lo
 
 
Muito se repete que as pessoas se preocupam demais em deixar um mundo melhor para os filhos e se esquecem de deixar filhos melhores para o mundo. Provavelmente, não é o seu caso. Não deveria ser o de nenhuma mãe ou nenhum pai. Afinal, quem construirá uma sociedade melhor se não aqueles que a compõem? E, em um futuro nem tão distante, serão justamente as nossas crianças esses construtores. Para que cumpram bem a função, cabe a nós ensinar a elas princípios como responsabilidade, capacidade de se colocar no lugar dos outros e autonomia.

A missão exige uma aliança ampla e irrestrita. "Antigamente, cobrava-se que a escola passasse às crianças apenas competências técnicas, enquanto a família ficava com os valores e as questões de afetividade. Só que, cada vez mais, pai e mãe têm que trabalhar muito para dar conta da sobrevivência, e seus filhos acabam ficando grande parte do tempo na escola. Portanto, mais do que nunca, a tarefa precisa ser conjunta", observa o psiquiatra Augusto Cury, que está lançando o livro Pais Inteligentes Formam Sucessores, Não Herdeiros (Editora Saraiva). Como fazer isso? No treino diário.

"Ninguém constrói valores sem praticá-los. Só o discurso e o sermão não são suficientes. Além disso, a postura do adulto de referência tem que estar de acordo com o que se defende", ressalta a educadora mineira Flávia Vivaldi, do Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação Moral formado pelas universidades estaduais de Campinas (Unicamp) e de São Paulo (Unesp). A seguir, detalhamos seis atitudes que todos devem querer ver em seu filho. Aí é só dar o exemplo e incentivá-lo a praticar.

1. SER RESPONSÁVEL
A mãe chega em casa exausta de um dia de trabalho e, em vez de sentar para jantar e conversar com os filhos, começa uma interminável catação dos brinquedos que estão espalhados pela sala. Soa familiar? Embora à primeira vista pareça ser a atitude mais lógica a tomar, estamos falhando como pais quando fazemos esse tipo de coisa, alerta o psiquiatra Içami Tiba, de São Paulo, que acaba de lançar o livro Educação Familiar Presente e Futuro (Integrare). É que perdemos a chance de ensinar às crianças um dos primeiros grandes valores: responsabilidade. "Filhos não nascem folgados, são os pais que os fazem assim. Às vezes porque querem ter a casa em ordem, em outras por pressa, eles não se preocupam em ensinar organização. E nem falo de responsabilizar os filhos por cuidar do que é de todos, mas apenas do que é deles", diz o especialista. "Crianças capazes de pegar o brinquedo da prateleira têm condições de guardá-lo de volta."

Aos poucos, esse ensinamento pode ser expandido para a arrumação da cama, do quarto até que a criança aprenda a cuidar do que está à sua volta. Na escola, em geral, a responsabilidade é cobrada em relação à entrega da lição, mas pode ir além também. "Há situações que estimulam esse princípio de forma mais completa. Por exemplo, delegando aos alunos pequenas responsabilidades na organização de atividades comuns, como a quadrilha da festa junina", indica Flávia. Quando se compromete com esse tipo de tarefa, a garotada costuma cumprir o combinado, pois há um grupo esperando aquilo. "O jovem não quer romper o contrato feito com a turma." Construir valores em situações significativas para a criança ou o adolescente é ainda mais efetivo.

2. PENSAR E AGIR SEM AJUDA EXTERNA
É quase irresistível - e, de longe, pode até ser interpretado como maldade: a criança, sem saber como montar o brinquedo ou errando ao soletrar uma nova palavra, e os pais em volta olhando, mudos. Se você se vê na cena, antes de assumir a culpa, pare e pense no bem que fará ao seu filho se deixar que ele aprenda por conta própria. E até que erre sozinho - especialmente o exercício da lição de casa, que precisa ser corrigido pelo professor para que ele saiba as dificuldades de cada aluno e o que falta ser reforçado em sala.
"Os pais, mais do que dar as soluções, devem perguntar: ‘O que você acha?', ‘O que faria?'.

Dar conhecimento pronto e respostas rápidas é uma forma de superproteção intelectual que promove, apenas, a lei do menor esforço. Bons educadores devem ser provocadores do raciocínio por meio da pergunta para que as crianças adquiram consciência crítica e saibam se colocar melhor no mundo", recomenda Cury.

Devolver a dúvida para o filho instiga a um desafio. Ele pode até reclamar de ter que resolver, mas, no fim, vai adorar perceber que consegue fazer aquilo sozinho. E, conforme for vencendo etapa após etapa, se sentirá fortalecido para confiar mais na própria capacidade, adquirindo cada vez mais autonomia. As mães devem colocar na cabeça que elas não precisam ser úteis aos filhos o tempo todo. Ok, é difícil cortar esse cordão, uma vez que não queremos ver nosso pequeno tropeçando ou sofrendo no caminho. Mas só assim ele vai aprender realmente e conseguir se virar em situações difíceis, tanto agora quanto quando forem adultos - em um mundo que não economiza na distribuição de obstáculos.

3. COLOCAR-SE NO LUGAR DO OUTRO

Vivemos em um mundo cada vez mais individualista, em que mal sabemos quem é nosso vizinho, muito menos por quais dificuldades ele passa - assim, é muito mais fácil reclamar por ele ter largado as malas atrapalhando a entrada no hall comum do que oferecer ajuda, cogitando se ele está enfrentando algum problema, como perdeu ou esqueceu a chave de casa. Nós nos restringimos ao nosso universo (que pode se limitar à tela do celular), não vemos mais nada do que acontece ao nosso lado.

Se nós, adultos, somos assim, como cobrar das crianças que aprendam a notar o que está em volta e, mais, colocar-se no lugar do amigo? Como mostrar que ninguém é pior por ter tido uma dificuldade em português ou ter errado o gol no jogo de futebol? E que pode, sim, ficar chateado ao ouvir os colegas rindo de suas falhas? "Os jovens de hoje são muito autocentrados. Eles pensam apenas no que diz respeito a eles e seus amigos ou familiares", aponta Flávia, que é também coordenadora pedagógica da Escola Municipal Wilson Hedy Molinari, de Poços de Caldas (MG), considerada por especialistas em educação um exemplo no ensino de valores.

"Para se colocar no lugar do outro, é preciso se exercitar. A escola deve criar situações para que o aluno pense nisso. Por exemplo, assembleias para discussão de questões do grupo, reuniões para construção de regras de convivência e trabalho comunitário." Ouvindo os colegas, fica mais fácil entender que o outro é diferente e tem necessidades que também precisam ser atendidas. "Ter empatia é perceber as intenções do outro, se ele está feliz ou sofrendo, se aquela sua atitude vai prejudicá-lo ou não. E isso é fundamental na vida", analisa Tiba.

4. FAZER POR MERECER

Não é uma situação rara: no aniversário do filho mais velho, a mãe bem-intencionada compra também uma lembrança para o caçula - o coitadinho ia ficar só vendo o irmão com brinquedos novos? "Um filho que faz aniversário merece, pela data, ganhar presente. O outro tem de aprender que o aniversário não é dele e pronto, vai ficar bem. Mas os pais viciam os dois a receber sempre", alerta Tiba. "Da mesma forma, criou-se o costume de dar um carro para o jovem que faz 18 anos. Que esforço ele fez para ganhar essa recompensa?", pergunta o expert.

Ao premiar sem mérito, corremos o risco de criar uma geração de mimados que não sabe o valor do empenho e vai cobrar, lá na frente, que a promoção recebida pelo colega de trabalho seja estendida a ele também. Ou, então, não vai saber lidar com a frustração de não ter sido agraciado. É a postura do "herdeiro", que vive de mesada, sem suor próprio, e só gasta o legado recebido - muito diferente da atitude do sucessor, que se preocupa em multiplicar e expandir o que ganhou porque entende o valor que aquilo embute.

Flávia, entretanto, atenta para um cuidado que a questão exige no meio escolar: "Reconhecimento pelo esforço é uma coisa, premiar grandes resultados é outra.
Existe uma tendência nas escolas de dar destaque ao aluno que se sai bem em determinada matéria. Como mostrar a importância do conhecimento para aquele que nunca conseguiu chegar em primeiro? Isso desestimula", questiona. E diz: "Acaba-se sempre trabalhando o fim, não o meio". Por isso, ela recomenda uma avaliação do processo e ensinar o aluno a ver e comparar como estava no início e aonde chegou. Assim, fica mais clara a evolução - que, aí sim, pode ser premiada.
5. SENTIR E MOSTRAR GRATIDÃO

A questão tem sido debatida à exaustão: os pais, com pouco tempo (e muita culpa), atolam as crianças com presentes e tudo que elas desejam. Os filhos, por seu lado, exigem cada vez mais. "No passado, os pais erravam sendo autoritários. Atualmente, erram sendo permissivos e ausentes. Se antes diziam `não' constantemente, agora, com raras exceções, se deixam explorar por filhos bombardeados por uma indústria que estimula o consumo desenfreado", avalia Cury. Por isso, é urgente ensinar às crianças e aos adolescentes a importância da gratidão. Do ato de olhar no olho do convidado que chega para a festinha de aniversário e, no lugar de já ir perguntando "Trouxe o que de presente?", agradecer pela presença, pelo abraço e, por fim, pelo pacote que ele oferece - seja o que for que tiver dentro, pois demonstra que ele pensou em você.

Não basta apenas um "obrigado" educado - é preciso ter um sentimento sincero. "Hoje, tudo é tão rápido e descartável que os jovens nem vivem a expectativa do desejo, são atendidos imediatamente. Por isso, a gratidão fica no esquecimento", diz Flávia. Para construí-la, é preciso retomar lá de trás as tais palavrinhas mágicas ensinadas aos menores (por favor e obrigado). "Não há caminhos que não a prática e o exemplo - o próprio professor tem que estar atento para agradecer quando um aluno pega sua caneta do chão", explica ela. O estímulo continua na proposta de trabalho em dupla ou em grupo, momento em que o aluno pode perceber a utilidade do auxílio prestado pelo amigo e ficar sinceramente grato a ele.

6. SABER LIDAR COM AS PRÓPRIAS EMOÇÕES
De maneira geral, transmitir um conteúdo técnico, como uma regra de gramática ou uma fórmula de matemática, é até mais simples do que lidar com as fragilidades emocionais e sociais. Tanto as dos adultos como as das crianças. Nada mais natural, portanto, que os pais, com cada vez menos tempo para dedicar à família, negligenciem essa área, formando crianças menos preparadas a administrar seus medos, suas expectativas e frustrações. "Pais que são manuais de regras sobre o certo e o errado estão aptos a lidar com máquinas, não a formar mentes brilhantes. Grande parte deles nunca dialogou com os filhos sobre suas emoções", aponta Cury.

Agora, se é assim em casa, o que dirá no ambiente escolar, acostumado a entupir os alunos de informações e conceitos. Pensando nisso, algumas instituições têm incorporado dinâmicas para facilitar esses cuidados. O Colégio Singular, no ABC paulista, por exemplo, adotou o método de Escola da Inteligência, criado por Cury. Com ele, são propostas atividades que facilitam as percepções emocionais - um exemplo é contar histórias em que os personagens vivem conflitos semelhantes aos das crianças. "O professor cultiva um ambiente em que o aluno sente que está sendo entendido e consegue ver uma saída para as próprias frustrações", conta a diretora, Rosanella Gambogi. Mas para que o processo seja sedimentado é importante que a troca entre a escola e os pais se mantenha constante - por meio de reuniões e até grupos de estudo.

PARA SABER MAIS
- Pais Inteligentes Formam Sucessores, Não Herdeiros- Augusto Cury (Saraiva).
- Educação Familiar Presente e Futuro - Içami Tiba (Integrare)
Existe uma tendência nas escolas de dar destaque ao aluno que se sai bem em determinada matéria. Como mostrar a importância do conhecimento para aquele que nunca conseguiu chegar em primeiro? Isso desestimula", questiona. E diz: "Acaba-se sempre trabalhando o fim, não o meio". Por isso, ela recomenda uma avaliação do processo e ensinar o aluno a ver e comparar como estava no início e aonde chegou. Assim, fica mais clara a evolução - que, aí sim, pode ser premiada.
5. SENTIR E MOSTRAR GRATIDÃO

A questão tem sido debatida à exaustão: os pais, com pouco tempo (e muita culpa), atolam as crianças com presentes e tudo que elas desejam. Os filhos, por seu lado, exigem cada vez mais. "No passado, os pais erravam sendo autoritários. Atualmente, erram sendo permissivos e ausentes. Se antes diziam `não' constantemente, agora, com raras exceções, se deixam explorar por filhos bombardeados por uma indústria que estimula o consumo desenfreado", avalia Cury. Por isso, é urgente ensinar às crianças e aos adolescentes a importância da gratidão. Do ato de olhar no olho do convidado que chega para a festinha de aniversário e, no lugar de já ir perguntando "Trouxe o que de presente?", agradecer pela presença, pelo abraço e, por fim, pelo pacote que ele oferece - seja o que for que tiver dentro, pois demonstra que ele pensou em você.

Não basta apenas um "obrigado" educado - é preciso ter um sentimento sincero. "Hoje, tudo é tão rápido e descartável que os jovens nem vivem a expectativa do desejo, são atendidos imediatamente. Por isso, a gratidão fica no esquecimento", diz Flávia. Para construí-la, é preciso retomar lá de trás as tais palavrinhas mágicas ensinadas aos menores (por favor e obrigado). "Não há caminhos que não a prática e o exemplo - o próprio professor tem que estar atento para agradecer quando um aluno pega sua caneta do chão", explica ela. O estímulo continua na proposta de trabalho em dupla ou em grupo, momento em que o aluno pode perceber a utilidade do auxílio prestado pelo amigo e ficar sinceramente grato a ele.

6. SABER LIDAR COM AS PRÓPRIAS EMOÇÕES
De maneira geral, transmitir um conteúdo técnico, como uma regra de gramática ou uma fórmula de matemática, é até mais simples do que lidar com as fragilidades emocionais e sociais. Tanto as dos adultos como as das crianças. Nada mais natural, portanto, que os pais, com cada vez menos tempo para dedicar à família, negligenciem essa área, formando crianças menos preparadas a administrar seus medos, suas expectativas e frustrações. "Pais que são manuais de regras sobre o certo e o errado estão aptos a lidar com máquinas, não a formar mentes brilhantes. Grande parte deles nunca dialogou com os filhos sobre suas emoções", aponta Cury.

Agora, se é assim em casa, o que dirá no ambiente escolar, acostumado a entupir os alunos de informações e conceitos. Pensando nisso, algumas instituições têm incorporado dinâmicas para facilitar esses cuidados. O Colégio Singular, no ABC paulista, por exemplo, adotou o método de Escola da Inteligência, criado por Cury. Com ele, são propostas atividades que facilitam as percepções emocionais - um exemplo é contar histórias em que os personagens vivem conflitos semelhantes aos das crianças. "O professor cultiva um ambiente em que o aluno sente que está sendo entendido e consegue ver uma saída para as próprias frustrações", conta a diretora, Rosanella Gambogi. Mas para que o processo seja sedimentado é importante que a troca entre a escola e os pais se mantenha constante - por meio de reuniões e até grupos de estudo.

PARA SABER MAIS
- Pais Inteligentes Formam Sucessores, Não Herdeiros- Augusto Cury (Saraiva).
- Educação Familiar Presente e Futuro - Içami Tiba (Integrare)
 

terça-feira, 17 de junho de 2014

As quatro crises do crescimento dos bebês

O bebê enfrenta problemas para dormir, se alimenta mal e anda agitado? Calma. Pode ser que ele esteja apenas atravessando uma crise comum à fase em que se encontra.

Primeiro trimestre: período simbiótico
Como começa a crise do primeiro trimestre?
A chegada aos 3 meses é um momento tão marcante que alguns autores falam de dois nascimentos: o biológico, que é o dia do parto, e o psicológico, que acontece quando o bebê completa 3 meses. Esse primeiro trimestre de vida é o que se chama de período simbiótico. “Para a criança, mãe e filho significam uma única palavra ‘mãefilho’. É assim que ela entende: como se fossem uma única pessoa”, diz, brincando, Leonardo Posternak, pediatra de São Paulo. A partir dos 3 meses, o bebê passa a olhar no olho da mãe, começa a se divertir, imita alguns gestos. Ele começa a sentir que a mãe não é só um bico de peito e, assim, começa a construir a imagem do outro.“É nesse período que a criança percebe que não está enroscado no tronco da árvore – que é a mãe. Ele está perto da árvore. Entende que precisa chamá-la para ter o que necessita – leite, colo ou fraldas limpas. Nessa hora, bate a ansiedade. É como se ela pensasse: ‘E agora? E se eu chamar e ninguém escutar? E se esse outro vai embora, o que eu faço?’ É aí que começa a crise”, explica Posternak.

Como saber se o filho está passando por uma crise?
A melhor maneira é ouvir o pediatra. “Algumas mães chegam ao consultório reclamando que há três dias o filho estava ótimo e, de repente, não quer mais mamar e tenta se afastar quando elas dão o peito. Outras reclamam que o bebê estava dormindo bem, mas, depois dos 3 meses, isso mudou. Ele acorda várias vezes chorando”, diz Leonardo Posternak, pediatra de São Paulo. “Há ainda as mães que reclamam que o bebê fica agitado sem motivo. Não quer ficar no colo, no berço, no bebê-conforto. Parece não estar confortável com nada que é oferecido”, continua. As queixas normalmente são parecidas e o seu pediatra saberá dizer se o bebê está com algum problema de saúde ou atravessando uma crise.

Quanto tempo dura a “crise do fim do período simbiótico”?
Essa crise dura em torno de 15 dias.

Nesse período, os bebês precisam ser medicados?
Não. Quando a criança atravessa uma crise, é muito importante que ela não seja medicada. “As mães sempre chegam ao consultório achando que a razão do desconforto tem algum aspecto orgânico: cólica, falta de leite, dente nascendo. Então explico que se trata de uma crise, um momento excelente para o crescimento”, ensina Leonardo Posternak, pediatra de São Paulo.

O que os pais devem fazer durante a crise?
Eles devem ficar calmos e entender que esse período vai passar. “Conhecendo os sintomas, os pais precisam dominar a ansiedade para que a criança não tenha que atravessar esse momento complicado num ambiente angustiante. Lembre-se de que o seu bebê precisa passar por essa crise para poder crescer”, explica o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.



Entre 5 e 6 meses: formação do triângulo familiar
Como começa a crise da formação do triângulo familiar?
Por mais que o pai tenha sido presente e ativo desde o nascimento do bebê, ele não teve uma relação tão simbiótica com o filho. Isso se dá por inúmeros motivos. Até mesmo porque ele não dispõe dos meses de licença-maternidade para ajudar nessa proximidade. Então, por volta do sexto mês de vida, o bebê, que já conhece a mãe, começa a reconhecer a figura do pai, dando início à formação do triângulo – e da crise.

Que sintomas a criança apresenta nessa crise?
“A criança tem um pouquinho de transtorno do sono, e o apetite diminui um pouco”, diz o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo. Mas essa crise costuma afetar mais as mães do que os bebês. “Nessa fase, a mãe se dá conta de que, para o filho ser saudável e feliz, ele precisa ter uma relação triangular e não uma relação de cordão umbilical com ela. Afinal, ninguém quer que o filho seja dependente a vida toda. É necessário que alguém corte essa simbiose. E esse é o papel do pai”, explica Posternak.

Com 6 meses, nascem os primeiros dentinhos. Essa etapa se confunde com a crise?
“Sim. Às vezes, isso acontece. As duas fases se confundem porque a dentição incomoda, dói e torna a criança aparentemente mais agressiva”, explica o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.


Oito meses: separação ou angústia
Essa crise acontece sempre no oitavo mês?
Não exatamente. Essa é a crise do terceiro trimestre. “Embora seja incomum, algumas crianças começam a dar sinais da crise com 6 ou 7 meses. Outras mostram sintomas de angústia com 9 meses. Mas na maioria dos casos isso acontece mesmo no oitavo mês”, explica o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.

Por que os pediatras dizem que essa é a crise mais significativa de todas?
“Porque essa é a que dura mais tempo e o transtorno do sono é muito acentuado: a criança pode chegar a acordar 15 vezes durante a noite, desperta muito assustada, com um choro intenso. Alguns pais ficam tão assustados que pensam que a criança caiu do berço porque é um choro diferente, desesperado”, esclarece o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.

Quanto tempo dura a crise da angústia?
Demora um pouco mais que as outras: três ou quatro semanas.

Os pais devem levar a criança para dormir na cama deles?
O ideal é que o bebê durma no seu berço ou carrinho desde os primeiros dias de vida. “Dormir na mesma cama se dá mais por ansiedade dos pais do que por necessidade dos bebês. E os pais não dormem tranquilamente, pois ficam com medo de sufocar o bebê. Sem contar que isso pode ocasionar um afastamento na vida conjugal”, explica Ana Paula Cargnelutti Venturini, mestre em psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Além disso, segundo Ana Paula, a prática pode levar a criança a ficar muito dependente dos pais, buscando uma atenção cada vez maior.

Nessa fase, quando a criança chora de madrugada, é a mãe quem deve atender?
De preferência, sim. O pediatra Leonardo Posternak explica a razão: “Na fantasia do bebê, ele acha que, quando a mãe apaga a luz e fecha a porta, não volta nunca mais. Então, se ele chora durante a noite e é atendido pelo pai ou pela babá, acredita que a mãe não voltará mesmo”. A criança precisa passar por isso para ir entendendo que a presença da mãe pode ser seguida de ausências. “Nessa fase, é oportuno que não ocorram trocas dos cuidadores. Além de acordar assustado, o bebê pode reagir à presença de estranhos, chorando ou estranhando o colo”, reforça Ana Paula Cargnelutti Venturini, mestre em psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. “A mãe deve tentar acalmá-lo no próprio berço para não alterar substancialmente sua rotina”, ela sugere.

Quais os sintomas da crise da angústia?
Basicamente os mesmos das outras crises: alteração do sono, perda de apetite e agitação. “O sono é o que mais perturba. Além disso, a criança come muito mal, pior do que nas outras fases. E às vezes faz até pequenas greves de fome”, comenta o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.

Qual a importância do objeto de transição nessa fase?
Nesse período de angústia, a criança começa a se apegar a algum objeto: pode ser um paninho, uma chupeta específica, um brinquedo. “Esse objeto representa a mãe, e é bom que ela brinque com o ursinho, por exemplo, que dê beijo, que deixe nele o seu cheiro. Isso vai ajudá-la a entender que à noite as coisas não desaparecem. A mãe pode sumir, mas o objeto continua ali e vai estar com ele quando acordar. Isso ajuda a criança a entender que esse afastamento não é uma perda”, ensina o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.

Como ajudar a criança a escolher o objeto de transição?
Os pais não precisam se preocupar em estimular a escolha, que é feita naturalmente pelo bebê. “É importante que o objeto resista às agressões da criança e que ela mesma o reconstrua. A mãe não deve lavá-lo nem tentar consertá-lo”, explica Ana Paula Cargnelutti Venturini, mestre em psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.


1 ano: ambivalência/dependência/independência
Como é a crise do primeiro ano?
Esse período coincide com o andar: a criança quer caminhar, quer ser independente, mas ainda precisa de colo. “Ela já se sente capaz de explorar o ambiente, já abre gavetas, tira todas as roupas de dentro, mas ainda não vai muito longe da mãe. A crise se dá por essa vontade de ser independente e a necessidade de ser, ainda, dependente.”

Quais são os sintomas dessa crise?
“As mães chegam ao consultório reclamando que a criança começou a acordar à noite, a não comer e a ficar muito agitada durante o dia”, diagnostica o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.

Os pais devem estimular a criança a caminhar?
Estimular, sim, mas jamais forçar. “O cérebro e as pernas ainda não estão combinados. Ela quer, porém não consegue, e isso gera angústia. A criança deve caminhar quando ela achar que pode”, alerta o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.

Como as mães devem lidar com as crises?
“Não existe uma receita ideal. Como todo relacionamento, é preciso adaptação, tranquilidade e equilíbrio, além de um ambiente saudável e acolhedor. Essas fases podem ser difíceis, mas são extraordinárias e marcantes”, finaliza Betina Lahterman, pediatra da Universidade Federal de São Paulo.


FONTE: http://bebe.abril.com.br/materia/as-quatro-crises-do-crescimento-dos-bebes

terça-feira, 10 de junho de 2014

"Por que tenho que ser bom?" - Trabalhando Ética com Crianças

No episódio “Por que tenho que ser bom?” da série "O que me faz ser eu?" (BBC Londres / MultiRio) a questão apresentada às crianças é: o que nos leva a escolher fazer coisas certas, e não erradas? Este texto pretende ajudar a trabalhar essas questões.
No vídeo, a história que dá início à discussão já era contada por Platão, quase quatrocentos anos antes de Cristo. Fala de um pastor que encontra um anel mágico: quando ele usa, fica invisível. O pastor era bom e honesto, mas será que resistiria à tentação de fazer tudo o que quisesse, mesmo que algo fosse errado, já que ninguém poderia descobrir? A identificação das crianças com o dilema é imediata. A pergunta que surge é: “E você, se tivesse um anel como esse, o que faria?”
No debate com crianças, vale trazer exemplos práticos. Uma ideia possível: situações que acontecem no trânsito da cidade. Aquele motorista que só para no sinal vermelho quando há um guarda controlando, o outro que não excede o limite de velocidade só no trecho que tem radar, ou aquele que consome bebida alcóolica e mesmo assim dirige, só porque não há blitz nesse dia. Será que essas pessoas só se preocupam com a vida quando há alguém vigiando? E a pergunta para as crianças: se não tivesse lei, nem guarda, nem câmeras: você sempre faria o que é certo?
Outras perguntas podem surgir na sequência, como por exemplo: “É certo fazer coisas um pouco erradas se você não puder ser pego?”; “Você faz as coisas certas porque gosta, ou por causa da opinião dos outros?”; Fazer coisas boas e corretas deixa você mais feliz? Por quê?”
Incentive as crianças, em casa e na escola, a pensar sobre as escolhas que temos que fazer a toda hora, na nossa vida.
Coloque situações que a própria criança poderia vivenciar, como por exemplo se achasse uma carteira com dinheiro, ou se fosse comprar seu biscoito favorito e recebesse um pacote a mais. Mesmo sem ninguém vendo, você se sentiria melhor devolvendo ou ficando com essas coisas? Por quê?
Um caso bem concreto da vida escolar é a postura nas avaliações. Se num dia de prova, o professor tivesse que sair da sala por alguns minutos, o que a criança imagina que faria? Praticaria uma transgressão, abrindo o caderno para olhar a matéria? Então, quando fazemos as coisas certas na escola, é só porque o professor está tomando conta?
Ótimo também trazer situações de casa, como por exemplo, o que a criança faria se os pais saíssem o dia todo: ficaria estudando ou só brincando?
Mas atenção, não se trata de dirigir o debate para lições moralistas sobre o que é certo ou errado. A ideia é incentivar o questionamento sobre o porquê de nossos atos e nossas escolhas, refletir sobre os valores estão na base do que fazemos.  Por isso, não há respostas certas ou erradas. O mais importante são as perguntas.
A discussão central neste episódio é: quem diz o que é bom ou mau, certo ou errado? Se somos livres, o que nos leva a escolher entre o bem e o mal? A lei, ou a nossa consciência? Quem é o juiz da sua vida: Deus? Sua família? Você mesmo?
E ainda uma discussão bem atual: muitas vezes as crianças dizem “Eu faço isso, porque afinal todo mundo faz”. A filosofia ajuda a lidar com essa situação em casa, na escola, na vida. Ora, porque todo mundo faz, algo passa a ser correto?
Explique aos seus filhos, ou aos seus alunos, que quem pensa dessa forma, perde a liberdade de escolher. Está deixando que os outros “façam a sua cabeça”.
A filosofia nos torna mais capazes de tomar nossas próprias decisões, com autonomia. Por isso é fundamental praticar essa atitude com as crianças! Talvez se aprendêssemos a questionar tudo isso desde cedo, nosso mundo não precisasse ter tantos radares, nem tantas câmeras, nem tantas leis.

 LINK DO VÍDEO: 
http://multirio.rio.rj.gov.br/index.php?option=com_mr_videos&layout=default&vid=931&arquivo=MED931.wmv&Itemid=414#


Para saber mais
·      SAVATER, Fernando. Ética para meu filho. São Paulo: Planeta Brasil, 2005.
·      PIGATTO, Lisete Maria Massulini. “Ensaio sobre a educação ética ou estética na escolar”. 
·      FERREIRA, Adriano Rodrigues. “A ética de Aristóteles e a educação: Reflexões: da ética aristotélica para a ética na sociedade brasileira atual”. 

FONTE: http://www.andrearamal.com.br/ferramentas-para-os-pais/por-que-tenho-que-ser-bom-trabalhando-etica-com-criancas

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Racismo é MUITO MAIS FORTE do que Todos Pensam

Ninguém é mais honesto que uma criança. Pensando nisso, pesquisadores fizeram um teste com bonecas para descobrir até que ponto o racismo está presente em nossa sociedade. O resultado foi mais assustador do que esperavam.
 
 
 
 
Você acha que esse experimento teria um resultado diferente com seus filhos, netos ou primos? Provavelmente não. O primeiro passo para mudar isso é perceber que o problema existe, então compartilhe essa mensagem.
 
 
Esse teste foi feito no México pela organização 11.11 Cambio Social e divulgado como parte da campanha "Racismo en México".

quarta-feira, 23 de abril de 2014

“Não é fácil a sociedade aceitar a maldade infantil, mas ela existe”

Sim, elas podem ser cruéis!
Um tabu impede que se discuta a maldade infantil. Mas ela existe. E pode esconder transtornos graves.
 
 
 
Aos 7 anos, T. convenceu seus pais, profissionais liberais de Belo Horizonte, a demitir duas empregadas domésticas. O motivo alegado: elas batiam nele. As duas negaram as agressões, mas o menino chegou a apresentar as marcas roxas no braço. Um ano depois, nova queixa sobre outra empregada. Revoltado, o casal decidiu colocar câmeras escondidas. O que viram foi uma surpresa: T. era o agressor, com pontapés e atirando brinquedos. No fim de uma semana, perguntaram se a empregada havia batido nele novamente. Choroso, T. respondeu que havia sido surrado na cozinha – onde as imagens não mostravam nada. Diante das sucessivas mentiras, foi castigado.
 
Três anos depois, reincidiu. Com os pais já separados, adquiriu o costume de tirar dinheiro da carteira dos dois, dizendo ao pai que era a mesada da mãe, e vice-versa. Os pais só descobriram a farsa durante uma discussão sobre dinheiro. Pouco antes, uma empregada fora mandada embora da casa da mãe depois do sumiço de R$ 50. T. disse que a vira pegar a nota. Diante disso, os pais concluíram que o menino precisava de tratamento. Poucas sessões depois, o diagnóstico foi duro: ele apresentava o chamado transtorno de conduta, nome formal para a velha “índole ruim”.
 
“Não é fácil a sociedade aceitar a maldade infantil, mas ela existe”, diz Fábio Barbirato, chefe da Psiquiatria Infantil da Santa Casa, no Rio de Janeiro. Ele explica que a criança ou adolescente que tem essa patologia pode se transformar, na vida adulta, em alguém com a personalidade antissocial – o termo usado hoje em dia para o que era chamado de psicopatia. “Essas crianças não têm empatia, isto é, não se importam com os sentimentos dos outros e não apresentam sofrimento psíquico pelo que fazem. Manipulam, mentem e podem até matar sem culpa”, diz Barbirato. Por volta da década de 70 do século passado, teorias sociais e psicanalíticas tentaram vincular esse comportamento perverso à educação e à sociedade. Nos últimos anos, porém, os avanços da neurologia sugerem a existência de um fenômeno físico: imagens mostram que, nas pessoas com personalidade antissocial, o sistema límbico, parte do cérebro responsável pela empatia e pela solidariedade, está desconectado do resto.
 
Um obstáculo para o tratamento de crianças com sinais de transtorno de conduta é o próprio tabu da maldade infantil. O senso comum afirma que as crianças são inocentes – uma crença que resulta da evolução histórica da família. Até o século XVII as crianças eram consideradas pequenos adultos e muitas nem sequer eram criadas pelos pais. No século XVIII, isso mudou. A família burguesa fechou-se em si mesma, dentro de casa. O lar virou um santuário e a criança o centro dos cuidados e das atenções. Foi o nascimento do sentimento de infância, dentro de um grupo que agora tinha como laços o afeto e o prazer da convivência. Se a criança é o eixo do sentimento moderno de família, ela não pode ser má. Eis o tabu.
 
Foto: Renato Rocha Miranda/Divulgação TV Globo
NÃO PODE
A atriz mirim Klara Castanho como Rafaela, a criança manipuladora de Viver a vida. A justiça não quer que ela seja má
 
 
Desde que a novela das 9 da TV Globo, Viver a vida, foi ao ar, em setembro do ano passado, o Ministério Público do Rio de Janeiro acompanha de perto a personagem Rafaela. A menina, vivida pela atriz mirim Klara Castanho, de 9 anos, desagradou à Justiça. O autor, Manoel Carlos, foi notificado. No documento, um pedido para que ele tenha “cuidado ao elaborar a personalidade de personagens cujos atores são menores de idade”. Na trama, Rafaela é uma menina mimada, que, para defender seus interesses, faz chantagem com uma amiga de sua mãe. Rafaela não pratica a maldade sem motivações concretas ou demonstra curiosidade mórbida. Ainda assim, o Ministério Público considera a personagem pouco adequada. Criança, aparentemente, não pode ser vilã.
 
As escolas, porém, desmentem isso: elas costumam ser o palco diário das maldades das crianças com transtorno de conduta. A psiquiatra carioca Ana Beatriz Barbosa Silva, autora do best-seller Mentes perigosas, diz que crianças e adolescentes com esse distúrbio costumam estar por trás dos casos mais graves de bullying. Em maio, ela lançará Bullying – Mentes perigosas nas escolas, com foco na maldade infantil. “É típico do jovem com transtorno de conduta saber mentir e manipular para que os outros levem a culpa”, afirma. Barbirato faz uma ressalva. “Pequenas maldades e mentiras são absolutamente comuns na infância. De cada 100, cerca de 97 têm comportamento normal e, ao amadurecer, saberão diferenciar o certo do errado e desenvolverão a empatia”, diz.
 
Mas, e os 3% que faltam? Serão obrigatoriamente personalidades antissociais na vida adulta, seres sem empatia? Os especialistas são taxativos ao afirmar que não se cura transtorno de conduta. Ele será, no máximo, amenizado se tratado a tempo e houver sempre algum tipo de vigilância. Na maior parte dos casos, porém, isso não acontece. E o resultado de ninguém ter notado esses sinais durante a infância aparece de forma trágica. “Essa criança poderá ser um político corrupto, um fraudador, até um torturador físico ou emocional, chegando a um assassino em série”, diz Ana Beatriz.
 
No último domingo, um exemplo extremo ocorreu na Pensilvânia, Estados Unidos. Jordan Brown, de apenas 11 anos, deu um tiro na nuca da namorada do pai, grávida de oito meses. O menino chegou a conseguir enganar a polícia dizendo que uma caminhonete preta havia entrado na propriedade da família. Mas a arma foi encontrada em seu quarto. A polícia não entendeu a motivação do crime. “Há casos em que a explicação é simplesmente uma curiosidade mórbida”, afirma Ana Beatriz. “Todos nós, quando pequenos, temos essa curiosidade. Mas, por volta de 4 ou 5 anos, começamos a ter a percepção do outro. O que não acontece com quem tem o transtorno de conduta.” A falta de tratamento dessas crianças é, muitas vezes, consequência da ignorância ou da falta de recursos. Mas não só. A estrutura familiar de hoje, com pais trabalhando fora o dia todo e com tendência a dar poucos limites aos filhos, favorece o desenvolvimento do transtorno de conduta. Qualquer criança que não é repreendida pelo pais sobre seus erros tende a crescer pouco civilizada. Se ela tem uma tendência antissocial, não haverá amarras para esse comportamento.
 
O relato de um psiquiatra do Rio Grande do Sul mostra quanto é difícil pais assumirem a necessidade de tratamento dos filhos. Em 2008, ele teve como paciente R., de 11 anos. A menina colocara fogo na mochila de uma colega de turma. Repreendida por professores e pais, teve como reação apenas rir. No ano anterior, fizera o mesmo com o rabo do cachorro de uma prima. Questionada, disse apenas que a prima não merecia ter um cachorro. Durante o tratamento, R. afirmou ao psiquiatra que não nutria nenhum sentimento especial em relação aos pais.“Ela tinha um olhar frio e uma ironia extremamente precoce para sua idade. Não sentia culpa. R. me tratava como um empregado”, diz o psiquiatra. Depois de um ano de tratamento, os pais acharam que ela estava melhor e poderia interromper as sessões. “Ela os manipulou – e disse a mim, explicitamente, que fingiria estar melhor e conteria seus atos. Contei a eles, mas não acreditaram em mim”, afirma. R. jamais voltou a seu consultório.


FONTE: http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI130697-15228,00.html